domingo, 12 de julho de 2020

"Rádio Patrulha": a melhor tira dos anos 30

O TEXTO A SEGUIR é uma tradução adaptada que você pode encontrar no site de Michael E. Grost (http://mikegrost.com/). Decidi traduzi-lo pois faz uma distinção muito boa que me permite afirmar: Rádio Patrulha é a melhor tira dos anos 30, com toda certeza.

Rádio Patrulha, por Michael E. Grost

A tira de aventura policial Rádio Patrulha (Radio Patrol) foi lançada diariamente entre 1933 e 1950, com as tiras dominicais saindo entre 1934 e 1946. Foi escrita por Eddie Sullivan, e desenhada por Charlie Schmidt. Seguia as aventuras do Sargento Pat (protagonista da tira), da policial Molly Day (Mariazinha), do parceiro de Pat, Sam (Samuel), e do jovem corajoso Pinky Pinkerton (Paulinho) e seu cachorro Irish (Rex). Pat parecia ser um policial irlandês, o que era uma tradição na época. Molly é inteligente, corajosa e competente, e é definitivamente uma das personagens menos sexualizadas nos quadrinhos. Ambos Sullivan e Schmidt trabalhavam para o mesmo jornal em Boston, e a série se passava no local e na sua vizinhança.

O elenco de protagonistas de Rádio Patrulha.

Rádio Patrulha era organizada em diferentes histórias sem continuação. Cada nova história tinha seu título revelado no último painel da última tira da história anterior. Como era comum na época, as tiras diárias tinham histórias diferentes das dominicais.
A tira gerou um seriado para o rádio e também um filme em série. Este foi lançado em 1937 e trazia Grant Withers [1] como o herói protagonista no papel principal.

Capa do filme em série Rádio Patrulha, de 1937.

Rádio Patrulha tinha alguns dos aspectos comuns em tiras dos anos 30: histórias longas, tonalidade mais séria, um herói protagonista bonitão, cenas de ação ocasionais, arte incrivelmente desenhada. Mas Rádio Patrulha é bem diferente no sentido de 'sentir a história' quando comparada às tiras de ficção científica famosas da época, como Flash Gordon [2], Brick Bradford [3] e outras: tudo em Rádio Patrulha é realista. Não há elementos de ficção científica ou fantasia. Os locais das histórias eram reais. As personagens estavam sempre usando roupas realistas — Pat, por exemplo, estava sempre em seu uniforme policial, ou em ternos ou roupas sociais, quando estava disfarçado. Isso diferencia a Rádio Patrulha de Flash Gordon e Brick Bradford, porque Flash e Brick estavam sempre mudando suas vestimentas de acordo com os locais que passavam. Pat não era o único protagonista, como Flash e Brick eram em suas próprias. Na verdade, o ponto de vista nas histórias era distribuído entre uma grande variedade de personagens, incluindo os vilões que iam surgindo. Enquanto que as personagens de tiras de ficção científica resolviam muitas aventuras com confusões e lutas, Rádio Patrulha tinha suas personagens realmente voltadas para a linha do detetivesco.

Rádio Patrulha de 9 de janeiro de 1937. Note as vestimentas
das personagens.

Os roteiros de Rádio Patrulha também são muito mais bem construídos do que a maioria das tiras de ficção científica da época. Todo acontecimento em Rádio Patrulha roda direta e logicamente ao redor das ações de uma das personagens. Esta pode ser o herói protagonista, um dos inúmeros vilões da série, ou até um suspeito em um crime. As interações das personagens e os acontecimentos gerados são o que constrói a história e leva à ação da tira. Em contraponto, outras tiras têm seus heróis a explorar um planeta novo ou uma antiga civilização, e esse fantástico lugar tem o propósito de desenrolar a história. O que as personagens e seus individuais são ou fazem tem muito menos a ver com o roteiro.

Rádio Patrulha de 18 de julho de 1936.

Também há um senso crítico de humor na tira. Não temos piadas feitas de propósito, para o leitor dar risadas. Na verdade, o senso de absurdo e a ironia pairam sobre as personagens. Os roteiros geralmente mostram isso de forma explícita. Uma afirmação ou atitude de uma personagem vai ser referida pelos outros como algo 'digno de uma comédia'.

Topper[4] Inimigos Públicos Através dos Anos e
tira de Rádio Patrulha de 6 de julho de 1935.

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Rádio Patrulha no Brasil

PELAS NOSSAS TERRAS brasileiras, Rádio Patrulha deu as caras em diversos dos antigos suplementos de jornais, como O Globo Juvenil e Suplemento Juvenil, além de coletâneas como o Almanaque do Globo Juvenil e o Almanaque do Gibi Nostalgia. Porém, a tira nunca foi algo tão grandioso como Mandrake, o Mágico ou O Fantasma foram.
Por conta disso, muitos lembram ou sequer ouviram falar da tira. Eu só vim conhecê-la através do site Comics Kingdom (https://www.comicskingdom.com/radio-patrol), onde as diárias saem de segunda a sábado. Como ela ganhou um posto muito importante como uma das minhas três tiras diárias favoritas (dividindo o espaço com Rip Kirby [5] e Brick Bradford), hoje, além da matéria acima, trago também uma história completa que tenho no meu arquivo de scans. Trata-se de Os Incendiários, que saiu por aqui no Almanaque do Gibi Nostalgia e lá nos E.U.A. entre 10 de maio e 7 de agosto de 1937.
Façam uma boa leitura (se a imagem estiver pequena, cliquem com o botão direito e então cliquem em "Abrir imagem em uma nova guia" para ampliá-la) e me digam se não concordam que a tira é realmente muito boa?














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Notas:

[1] Nascido em 1905, Granville Grant Withers foi um famoso ator norte-americano. Estreou em filmes mudos, mas logo migrou para os com som. Entre seus papéis de destaque, foi o protagonista do filme em série de 1937 Jungle Jim (Jim das Selvas). Faleceu em 1959, com 54 anos.

[2] Considerada uma das mais famosas histórias em quadrinhos de ficção científica de todos os tempos, Flash Gordon foi criado em 1934 por Alex Raymond. A tira foi tão importante que até hoje inspira diversas gerações. Talvez a mais importante inspiração tenha sido a de George Lucas, que tentou fazer um filme da tira em 1970, mas, tendo seus direitos negados, criou então o universo de Star Wars. Teve uma série recente no canal Syfy, no ano de 2007.

[3] Com roteiros e desenhos criados respectivamente por William Ritt e Clarence Gray, em 1933, Brick Bradford foi uma das mais importantes histórias em quadrinhos de ficção científica. Seguiu sendo publicada até 1987, quando teve seu encerramento pelas mãos de Paul Norris (o mesmo criador de Aquaman).

[4] Do inglês, "mais acima", "no topo". As toppers eram tiras secundárias que vinham logo acima da principal tira de uma página dada a um cartunista nos jornais antigos. Foram muito famosas durante os anos 20 e 30.

[5] Lançada em 1946 pelo mesmo criador de Flash Gordon, Alex Raymond, Rip Kirby (conhecido no Brasil como Nick Holmes, em associação ao famoso detetive inglês) é talvez a mais realista tira de detetive do século passado, e uma das mais importantes, dividindo o posto com Dick Tracy. Raymond já havia criado três tiras famosas anteriormente — Flash Gordon, Jim das Selvas e Agente Secreto X-9 — e, após a Segunda Guerra Mundial, não voltou a trabalhar nelas, mas decidiu criar uma totalmente nova. Trabalhou em Rip Kirby até sua morte, em 1956, quando John Prentice assumiu a arte e a levou até o fim, em 1999.

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Referências:

• GROST, Michael E. Radio Patrol. Disponível em http://mikegrost.com/patrol.

• RIBEIRO, Antônio L. Eddie Sullivan. Disponível em http://www.guiadosquadrinhos.com/artista/eddie-sullivan/4018.

• RIBEIRO, Antônio L. Charles "Charlie" Schmidt. Disponível em http://www.guiadosquadrinhos.com/artista/charles-charlie-schmidt/4019.

Lucas Cristovam, 12 de julho de 2020,
Parnamirim, Rio Grande do Norte, Brasil.

Um comentário:

  1. Para variar, mais um bom e belo texto pleno de informação sobre esta adorável tira!

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